terça-feira, fevereiro 12, 2008

JOÃO SEM MEDO

Tive um final de semana sensacional; o tempo inteiro empunhando "Vida que segue - João Saldanha e as Copas de 1966 e 1970". Trata-se de obra organizada por Raul Millet, através da qual são eternizadas as crônicas escritas por João Saldanha à época das Taças do Mundo. O conteúdo das colunas não é só sensacional, mas, principalmente, de surpreendente atualidade. Mais de três décadas se transcorreram, mas as observações do mestre Saldanha permanecem quase que integralmente pertinentes, a revelar um homem muito além de sua época.

Alguns textos são provocativos, outros denunciam, vários ensinam, muitos redesenham no papel jogadas inesquecíveis; alguns fazem chorar, tamanha a emoção que carregam. Como disse Villas Boas Correa, sua narrativa era feita em linguagem despojada, com fantástica capacidade de escrever no mais puro coloquial. João Saldanha foi personagem marcante não só do desporto nacional; era jornalista como todos os jornalistas deveriam ser. Nas palavras de Carlos Vilarinho, "usou como poucos o canhão (o microfone). João era um homem público, um tribuno popular (amado e temido), embora frequentemente tolhido por um Estado policial. Assistente político dos guerrilheiros camponeses, hábil organizador dos operários. Dirigente partidário, disciplinado, mas que sabia pensar. Saldanha foi um homem de vanguarda (comunista, naturalmente). Isto explica o ódio que os democratas de fachada e os reacionários de carteirinha sempre lhe devotaram. Mas estes passarão. João Saldanha ficará.".

E, de fato, ficou. Tive a sorte de ainda pegar o João Saldanha nas mesas redondas da TV Manchete aos domingos de noite, de dedo em riste, enfrentando os dirigentes; muitas vezes o vi quase ir as vias de fato (uma vez, se não me engano, ele partiu para cima de um cartola). Nunca me esquecerei do ato corajoso do homem a beira da morte que enfrentou tudo e todos para morrer, em 1990, na Itália, de microfone na mão, comentando a Taça do Mundo (seu habitat natural). Como agradecimento às suas lições, vou compartilhar algumas crônicas com os amigos, iniciando por "Vitória da Arte", escrita após a vitória sobre a Itália e a conquista definitiva da Jules Rimet, que resume o João Saldanha diante da vida e do futebol.


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