quinta-feira, dezembro 25, 2008

REGRESSO

Regresso só para casa,

como no passado,

mas dessa vez livre,

para retornar

ou para ficar

até o final de tudo.

.

Não sinto o gosto amargo do fracasso

de uma noite imaginada.

Não lamento as tantas coisas

que desejava para mim.

.

Voltei só, um só livre,

de bar em bar,

sem indagações, sem compromissos,

com hoje ou amanhã.

.

O caminho para casa foi toda cidade,

das curvas da Dona Laura e da Vasco,

da Ipiranga completamente deserta

à Santo Antonio e à Farrapos,

da Beira-Rio em segunda marcha,

com o rio iluminado ao fundo;

da guria que pulava de alegria.

A cidade acordada

como há tempos não desfrutava

num dia desses.

ESCÂNDALO

"Mas doce irmã,
o que você quer mais
?
Eu já arranhei minha garganta toda
atrás de alguma paz
.

Agora nada
de machado e sândalo
.
Eu já estou sã
da loucura que havia em sermos nós
.

Também sou fã
da lua sobre o mar
.
Todas as coisas lindas dessa vida
eu sempre soube amar
.

Não quero quebrar
os bares como um vândalo
.
Você que traz o escândalo
irmã luz.


Eu marquei demais,
tô sabendo.

Aprontei de mais,
só vendo
.

Mas agora,
faz um frio, aqui!

Me responda,
tô sofrendo.

Rompe a manhã
da luz em fúria arder

Dou gargalhada, dou dentada na maçã da luxúria, pra quê?

Se ninguém tem dó,
ninguém entende nada

O grande escândalo sou eu, aqui, só.

Mamãe, eu já marquei demais,
tô sabendo
.
Aprontei demais,
só vendo.

Mas agora faz um frio, aqui!
Me responda,
tô sofrendo
.

Rompe a manhã
da luz em fúria arder
.
Dou gargalhada, dou dentada na maçã da luxúria, pra quê?

Se ninguém tem dó,
ninguém entende nada

O grande escândalo sou eu;
aqui só." (Caetano Veloso - Angela Rô Rô)

terça-feira, dezembro 23, 2008

Chuva de Verão

Nuvens escuras apontaram no horizonte,

primeiro no sul,

depois, em rápido movimento,

cercaram o sol, a casa

e, em minutos, tomaram conta do céu.

.

A natureza inteira se alvoroça.

O Ingá, os eucaliptos, o robusto pinheiro,

dançam ao sabor do vento,

a cada rajada expelem odores

e coreografam a paisagem.

.

Trovões e raios.

Pássaros agitados

cruzam o espaço,

as vezes em vôos razantes,

ouço cânticos e gorjeios,

soam como sinfonia;

até o galo brada forte,

denunciando a repentina mudança.

.

Por breves segundos,

tudo para.

Não há cheiros, vôos ou sons,

somente o ar pesado

e a certeza do que se aproxima.

.

Os primeiros pingos

deitam sobre a terra quente,

sinto o indescritível odor abafado,

quase posso vê-lo

a se desprender do chão.

Despenca água,

não se ouve mais nada

além da força da chuva.

.

Para onde foram os pássaros ?

E o vento para onde foi ?

As árvores já não dançam,

agora quedam inertes

sujeitando-se às vontades da chuva.

.

O universo está paralisado,

nada se movimenta,

a não ser a cachoeira d´água;

são minutos de monopólio total.

RECORDAR É VIVER II

Sempre digo: é bom demais ser Colorado! E nessa época de final de ano a coisa ganhar proporções ainda maiores. Dia 14 primeiro título de Campeão Brasileiro, dia 16/17 primeiro e único gaúcho a conquistar o título de Campeão Mundial FIFA e agora, hoje, primeiro e único CAMPEÃO NACIONAL INVICTO. Quem possui tamanhas honrarias ? Aqui na Aldeia, certamente, ninguém!

Como esquecer daquele 23 de dezembro de 1979 em que assisti pela televisão o desfile de Falcão contra o Vasco ? Ainda guri, com 6 anos de idade, saí para as ruas, empunhando minha bandeira do Internacional e vestindo a camisa rubra número 5, para comemorar meu primeiro título Nacional (em 1975/76 ainda estava no berço). E olha que eu nem tinha noção de que aquela façanha - de conquistar um Nacional de forma invicta - jamais seria igualada (já se vão quase duas décadas e ninguém consegue repetí-la).

Já sem Don Elias Figueroa, Manga, P.C. Carpegiani, C. Duarte, Vacaria, Caçapava, Flavio/Dario e Lula, o Internacional seguiu na política de montar uma equipe genuinamente gaudéria para seguir conquistando títulos de relevo. Ainda tínhamos Falcão, Valdomiro e o Príncipe Jajá, que era um guri em 75/76, e a eles acrescentamos Mauro Galvão, João Carlos, Mauro Pastor, Cláudio Mineiro e Bira. Foi montado, assim, um grupo que coletivamente se mostrou imbatível, dentro e fora do Gigante da Beira-Rio. Sob o comando do saudoso Ênio Andrade, Falcão teve uma temporada de gala - mostrando ao país o quão injusta foi sua não-convocação por Coutinho para a Copa da Argentina 78 - e a força coletiva era tamanha que o grande destaque no jogo de ida da final foi Chico Spina, autor dos dois gols que calaram o Maracanã, em substituição ao imprescindível Valdomiro.

A campanha foi fantástica, em 22 jogos foram 15 vitórias e 7 empates, com 40 gols pró e míseros 13 gols sofridos, incluindo vitórias sensacionais contra Goiás (oitavas de final), Cruzeiro (3x2, no Mineirão, pelas quartas de final). Nas semifinais vencemos o Palmeiras, (3x2 em SP - com atuação de gala de Falcão - e 1x1 no Gigante). Os paulistas tinham uma bela equipe capitaneada por Luís Pereira e que contava com nomes como Jorge Mendonça e Mococa, que também não resistiu à força do Colorado.

Depois de vencer o Palmeiras nas semifinais, com aquele gol inesquecível do Falcão num sem pulo de fora da área, o Colorado partiu para os confrontos decisivos com o Vasco da Gama de Leão, Roberto Dinamite e companhia. E venceu as duas partidas, de forma inapelável. No Maracanã foram 2x0, com atuação inspirada de Chico Spina (substituindo nada mais nada menos que Valdomiro, ídolo para sempre). No Beira-Rio lotado (foto ao lado) jogamos para carimbar a faixa e confirmar a inédita conquista invicta.

Até hoje ninguém repetiu a façanha!


Matéria do Globo Esporte depois da vitória de 2x0 sobre o Vasco no Maracanã
Youtube - Gols da campanha
Matéria da Gazeta Esportiva, com escalações das 2 partidas finais

domingo, dezembro 21, 2008

À Espera do Sol...

Quero ver o dia amanhecer novamente. Espero a madrugada passar, vou navegando por ela, procurando o que fazer em meio à escuridão. Ando por aqui e acolá, faço o que tinha de ser feito, deixo tudo pronto para quando a manhã trouxer luz. Tudo acontece como se fosse a primeira vez, como se a chegada do sol fosse uma grande novidade; expectativa e inquietação na madrugada.

sábado, dezembro 20, 2008

GAUCHADA

“Me alcé con tuito el apero,

freno rico y de concoja,

riendas nuevitas en hoja

y trensadas con esmero;

una carona de cuero

de vaca, mui bien curtida;

hasta una manta fornida

me truje de entre las carchas,

y aunque el chapiao no es pa marchas

lo chanté al pingo en seguida

Hice sudar al bolsillo

porque nunca fui tacaño;

traiba un gran poncho de paño

que me alcanzaba al tobillo

y a un machazo cojinillo

pa descansar mi osamenta;

quise pasar la tormenta

guarnecido de hambre y frío

sin dejar del pilcherío

ni una argolla ferrugienta.” (LUSSICH, Antonio – “Los Tres Gauchos Orientales”)

quarta-feira, dezembro 17, 2008

terça-feira, dezembro 16, 2008

domingo, dezembro 14, 2008

RECORDAR É VIVER!

Pois é. Foi em 14 de dezembro de 1975 que o Internacional conquistou o título mais importante da história do futebol gaúcho. O Campeonato Nacional daquele ano representou a abertura de portas do cenário nacional para nossos clubes. O Colorado já havia beliscado o caneco em 1972, 73 e 74. E a conquista não poderia ser mais gloriosa. Enfrentamos naquele 14 de dezembro o super time do Cruzeiro de Nelinho, Zé Carlos, Joãozinho, Piazza, Raul, Palinha e companhia. Era um super time, sem dúvida, mas que se curvou diante da Academia Rubra do Internacional. Manga, C Duarte (Valdir na final), Figueroa, M Perez (Heminio na final), Vacaria (Chico Fraga na final), Caçapava, PC Carpegiani, PR Falcão, Valdomiro, Flavio e Lula. Que timaço!

Don Elias tinha o lema "A área é minha casa, aqui só entra quem eu quero!". Don Elias não se limitou a cuidar da área Colorada. Na final resolveu invadir a área inimiga e marcar um gol que jamais sairá da mente da Nação Colorada. Aos 10 minutos e 40 segundos da segunta etapa, numa cobrança de falta de Valdomiro pelo flanco direito, enquanto o torcedor gritava sem parar "Colorado! Colorado! Colorado!", anotou o Gol Iluminado, marcado de cabeça, na única faixa ensolarada sobre o gramado do Beira-Rio naquela tarde.

Falcão maravilhou o país com suas atuações fantásticas durante todo o certame. Manga fez defesas cruciais, sendo a mais notória aquela, na final, com o dedo quebrado, em que espalmou um petardo de Nelinho, já com o placar marcando 1x0 a nosso favor. Carpegiani era um motor de criatividade e foi imprescindível, anotando o gol que garantiu a derrubada da máquina tricolor (time do Fluminense considerado imbatível pela imprensa do Eixo). Valdomiro e Lula formavam a maior dupla de ponteiros que o futebol mundial já viu em ação. E, finalmente, Flavio Bicudo era um matador em potencial. Marcou 16 gols no certame e sagrou-se artilheiro da competição.

A campanha do Interancional foi avassaladora. Liderado por Rubens Minelli, o Inter jogou 30 partidas, com 19 vitórias, 8 empates e apenas 3 derrotas, 51 gols pró e apenas 12 gols contra. O Internacional de 1975 foi o maior time de futebol gaúcho e um dos maiores que o mundo viu jogar.

Matéria do site do Internacional com um pouco da história do Esquadrão da Década de 70.
Excursão Invicta do Inter a Europa em 1975
GOL do Título Gaúcho - HEPTA contra os pijaminhas
GOL do Carpegiani que liquidou a Máquina Tricolor em pleno Maracanã
COMPACTO DA FINAL com narração de Celestino Valenzuela

sábado, dezembro 13, 2008

SOBRE O TEMPO...

“Moreno, voy a decir,

sigún mi saber alcanza:

el tiempo sólo es tardanza

de lo que está por venir.

No tuvo nunca principio

ni jamás acabará,

porque el tiempo es una rueda

y rueda es eternidá;

y si el hombre lo divide,

sólo hace, en mi sentir,

por saber lo que ha vivido

o le resta que vivir.” (HERNANDEZ, José – “Martin Fierro”)

JURAMENTO DE PLAYBOY

"Eu jurei fazer de tudo pelo nosso amor
Eu jurei deixar a minha vida de playboy
Eu jurei trocar meu pé de bode por um Volks
E as calças justas por um terno de senhor

Eu jurei deixar a Rua Augusta por você
Minha cabeleira de "taogana" vou cortar
O sapato branco por um preto vou mudar
E o blusão vermelho nunca mais eu vou usar

Esse juramento de Plaboy que lhe fiz
Falta pouco tempo para o prazo terminar
Neste fim de ano doutor vou me formar
Logo depois com você vou me casar

Deixe aproveitar o que me resta por favor
Não posso deixar a turma agora meu amor
Falta pouco tempo para deles me afastar
Logo depois com você vou me casar

Logo depois com você vou me casar
Logo depois com você vou me casar" (Carlos Gonzaga)


quinta-feira, dezembro 11, 2008

LENDA VIVA

As vezes temos sorte ao ligar a televisão. Hoje era meu dia; lá estava Eduardo Galeano no programa "Encontros para a História" do canal SPORTV. Em regra, o roteiro do programa envolve uma espécie de debate com 2 ou 3 personalidades. Mas hoje só deu Galeano, ele monopolizou por completo as atenções. E, de fato, trata-se de uma mente privilegiada; capaz de escrever sobre qualquer assunto com a mesma propriedade, da antologia político-social "Veias Abertas da América Latina" ao indispensável caderno de anotações "Futebol ao Sol e à Sombra", no qual traça brilhantes comentários sobre os bastidores desse mundo maravilhoso da bola. Acima de tudo uma grande figura, um jovem de 70 anos, cativante pelo dom da palavra, de calça de brim e camiseta regada, ensinando-nos a pensar e agir.

terça-feira, dezembro 09, 2008

geral é COLIGAY2000

E quem disse isso foi o Paulo Santana.

terça-feira, dezembro 02, 2008

ESTRATÉGIA I - o personagem

O Seu Adão é um dos personagens mais folclóricos aqui das redondezas do sítio. Tem uma quitanda muito sortida bem na entrada da estrada principal que leva à minha casa, ao lado do pórtico; ali vende frutas, verduras e lenha. Porém, sua especialidade é uma conversa sem prazo de duração. Anda pela curva dos setenta e é aquele tipo que sempre tem uma história diferente para contar. É claro que a banca do Seu Adão é sempre parada obrigatória entre esses dois mundos.

Hoje estacionei para comprar umas bananas e laranjas e saí de lá com algumas lições de sobrevivência fundamentais. Como definiu Seu Adão, “estratégias do tempo de minhas andanças pelo São Pedro”. Contá-las-ei em primeira pessoa.

ESTRATÉGIA II - o cenário

- Está por aí ainda Seu Adão ?

- De saída.

- Pois é, já são 8 horas.

- É, o Mercado já fechou. Quando ele fecha eu fico só mais um pouco e já vou saindo. No Natal não, no Natal tem de ficar até mais tarde.

- Seu Adão, a sua banca não era ali no canteiro ?

- Era, tu te lembra, fiquei ali uns 12 anos. Agora estou aqui faz uns 8 anos.

Tu sabe como é que eu comecei nessa de vender fruta ? Eu tinha meus 20 e poucos anos, montei uma banca de frutas ali na Avenida do Trabalhador com a Baltazar, bem ali no meio daquele cruzamento que hoje é movimentado. Fiquei trabalhando ali por quatro anos. Não tinha movimento.

Naquele tempo a Ceasa ficava ali na Praia de Belas. Não sei se tu te lembra disso, não deve se lembrar. Pois era ali, na Praia de Belas. Eu pegava a carroça e ia de lá até a Praia de Belas, era longe, passava por Petrópolis, contornava o Morro Santana. Era longe demais.

Saia às 9 da manhã e voltava lá pelas 5 da tarde, com a carroça cheia de fruta e verdura e abastecia minha banca. Trabalhava até tarde, todo dia, e de lá tinha de ir para Alvorada, aonde morava minha mãe. Quando saia antes da meia noite pegava um ônibus e deixava a carroça por lá, mas quando saia tarde ia de carroça mesmo. Era uma “cansera danada”. No outro dia voltava cedo para trabalhar.

Mas a minha esperança é que diziam que aquela estrada do Porto Seco ia ser aberta e que ia sair lá no Humaitá; aí o movimento ia crescer. Mas nunca saiu, hoje saiu, mas naquela época eu só ficava na esperança. Trabalhei quatro anos nessa esperança, nessa “cansera danada” e acabei surtando. Fui parar no São Pedro.

ESTRATÉGIA III - "ande sem olhar para o lado"

Lá no manicômio São Pedro foi uma lição. Porque lá era pior que cadeia. Fiquei um ano lá dentro. Os caras vinham para cima de ti e tu tinha de aprender a se virar, a se defender. Porque lá só tem gente do pior tipo, e tu nunca sabe o que se passa na cabeça. Eu nunca fui de briga, aí tive de aprender a me virar.

Eu conheci o José, um sujeito “clarinho”. O José era magro que nem eu. As irmãs nos respeitavam, porque agente ajudava muito a organizar tudo lá dentro. Eu e o José éramos “cotados” lá dentro; agente capinava, trabalhava no jardim; de vez em quando agente até tinha uns “privilégios” de comer lá dentro da cozinha com as irmãs. Agente era “cotado”.

Um dia apareceu um cara lá que era “deste tamanho” (imitando um gorila apresentando seus músculos). Era um bugre “deste tamanho”! E ficava parado sempre no mesmo lugar. Era tipo um corredor, aonde todo mundo tinha de passar. E o bugre parava bem ali (sobe num caixote de frutas e imita o bugre parado como um gorila). Todo mundo tinha de passar por ali. E quando os caras passavam ele agarrava pelos cabelos e dava um murro no sujeito.

Mas para jantar agente tinha de passar por ali. Aí eu chamei o José e disse:

- Zé, nós vamos passar por ali.

- Mas será Adão ?

- Vamo! Escuta, eu vou primeiro e tu fica me olhando. Depois é só tu fazer igual.

E eu tinha estudado bem o caso. Eu ficava olhando aquilo. Os caras passavam e o tal bugre pegava todos pelo cabelo e dava um murro. Mas eu percebi que era só quando eles encaravam o cara. Então a minha “estratégia” era passar devagar, bem tranqüilo, olhando para frente, sem virar o olho para o lado (nesse momento o Seu Adão simula a caminhada). E eu passei! (dando um grito e se rindo todo). E depois o José passou do mesmo jeito (e nesse momento simula o Zé, caindo na risada já no meio da caminhada).

Eu tinha estudado a situação. A estratégia era andar sem olhar para o lado, não encarar o cara, diz o Seu Adão, gritando com a voz esganiçada pelo riso e dando um tapa no meu braço.

ESTRATÉGIA IV - "faça amizade com o inimigo"

Mas tu sabe: o que tinha de louco lá dentro (colocando a mão na cabeça). E eles eram tudo perigoso. Deixa só eu te contar outra “estratégia”. Tinha época em que eram mais de 100. Aí eu e o José ficávamos cada um de um lado. Ele lá e eu aqui. Agente era os guardas ali dentro.

Por isso que eu te digo que as irmãs nos respeitavam. Agente era “cotado”, eu e o José. Eles queriam botar fogo em tudo. Aí eu disse para o Zé que nós tínhamos de cuidar aquilo, porque se um louco daqueles tocasse fogo lá dentro nós íamos nós dar mal também. E as irmãs distribuíam uns ramos de fumo. Eu nunca fumei, mas sempre pegava o ramo de fumo, porque aquilo ali eu usava para desarmar os loucos. Eu fazia amizade com eles com o ramo de fumo.

Eu chegava perto e pedia o fogo emprestado ou até a faca, porque eles, as vezes, conseguiam uma faca ou um canivete mesmo. Aí eu pegava a faca e dizia que ia “mijá” e não voltava mais com a faca do cara. Depois eles esqueciam (caindo na risada).

Eu cheguei a guardar 15 ou 20 faca; aí entregava tudo para a irmã. E ela perguntava como é que eu conseguia. A “estratégia” era não enfrentar os caras, porque, tu sabe, “eles são violento”. Não dava para chegar e tomar a arma. A minha “estratégia” era pedir emprestada para cortar o ramo de fumo; ou mentir que fumava para pegar a caixa de fósforos e inventar uma desculpa para sair de fininho.

ESTRATÉGIA V - "aprenda a caminhar para trás"

Ih, de vez em quando eu até saia lá de dentro. Tinha outra estratégia que eu saia lá de dentro, para tomar um ar na rua e ver uma paisagem diferente daqueles muros; tu sabe como é que é, né! (fazendo gestos de estar rodeado por muros). Mas eu saia e sempre voltava. Eu dizia para o José que eu queria fazer tudo direitinho, porque meus parentes iam me procurar. E eu sempre dizia para o José que eu queria sair lá, mas tudo certinho, para trabalhar. Eu quero sair daqui para trabalhar!, eu dizia para o José. O Zé também dizia.

Mas a minha outra “estratégia” era o seguinte: eu caminhava para trás. Assim ô! (e faz a caminhada para traz, se movendo para trás, mas dando passos, com flexões longas de joelho, como se estivesse numa caminhada normal). Hoje eu não consigo mais fazer direito, mas na época, “bem treinadinhu”, tu tinha de ver. Hoje eu conto para as pessoas e tem gente que não acredita. Mas naquele tempo “eu tava treinadinhu”. Eu saí várias vezes lá de dentro, na hora do tumulto. No dia da visita, na hora daquele tumulto todo, eu me misturava na multidão e saia lá de dentro caminhando para trás (cai na risada).

Tu sabe como é. Os guardas ficam ali na guarita cuidando tudo. Mas eles só ficam cuidando a “cara” das pessoas que estão saindo, de frente né! (e imita um guarda olhando para tudo que é lado). E eu lá no meio, caminhando para trás, dava a impressão de que eu estava indo na direção contrária das pessoas que estavam saindo, entendeu! (caindo na risada e me dando um tapa no braço).

Depois eu ensinei o José a fazer isso, e ele fazia também (caindo na risada novamente). Mas só nos dois. Ninguém mais saia. Quando eu voltava os guardas perguntavam:

- Mas como é que tu saiu ? Desse jeito tu vai arrumar complicação para nós Adão.

Eu não dizia, claro. E assim a gente vai. O tempo ensina muito; tu é obrigado a apreender com cada situação nessa vida. Chegou um cara querendo laranjas do céu. O Seu Adão, louco para continuar a conversa, dispensou o sujeito, afirmando que esta época não existe laranja do céu.

Aproveitei a deixa. Peguei um cacho de bananas, 6 laranjas para suco, um pacote de cenouras e um mamão. Paguei. R$ 3,50. Muito barato, pensei. Despedimo-nos com um aperto de mão forte. Liguei o carro e quando fui saindo ele ficou lá, repetindo as mesmas palavras de sempre:

- mas é bom conversar, não é ? aparece sempre vizinho! (aumentando o tom de voz).

segunda-feira, dezembro 01, 2008

ATENÇÃO! MUITA ATENÇÃO!

Cuidado, muito cuidado, pois a invasão "porteña", versão 2008/09, já está em andamento. Hoje trafegava pela BR-290, tranquilo, obedecendo o limite de 90/100 Km/h, quando fui ultrapassado por uma dessas "pick ups" com um jet sky a reboque (e placa arrentina, é claro!). A ultrapassagem foi imprudente e com velocidade absurda, em trecho com linha amarela contínua (ou seja, proibido ultrapassar). Minutos após, fui ultrapassar um caminhão que trafegava lentamente; olhei no retrovisor e lá vinha outra "pick up" voando baixo, como se não houvesse mais ninguém na estrada. Aí tive o prazer de me colocar em posição de ultrapassagem e bloquear o "arrentino"; como que fazendo questão de deixar claro que, aqui no Brasil, quem manda somos nós. Preparem-se, porque a horda porteña já está a caminho.