quinta-feira, março 04, 2010

IGREJA

“E por que eu teria ido à igreja aquela manhã ? Porque apesar do meu roteiro de fornicações eu também tinha momentos de tédio e vazio. E apesar de ter verdadeira ojeriza por igrejas e instituições e seitas (principalmente a igreja católica que, ao longo da história e em nome daquele deslumbrante que era Cristo, matou saqueou incendiou seres cidades e países, ah, sempre me pareceu que as ligações entre o lá de cima e o homem entraram há muito em curto-circuito, você pede pra falar com Sydney, Austrália, e te dão Carapicuíba e quejandos. Evidentemente que o Deslumbrante não mandou recados de assassinatos e torpezas, torpe é a nossa natureza, imundo e dilacerado é o homem, imundo sou eu, Crasso, mas querem saber ? Não vou falar disso não, imundos são vocês também, todos nós e se eu continuar falando não vou conseguir mais foder. E foder é tudo o que resta a homens e mulheres. Vamos às fodas, senhores. Só mais um minutinho: para mim o homem foi feito pelo demo. Na História aprendi que os cátaros, os albigenses, que naturalmente vocês não sabem quem são e devem procurar saber, também pensavam assim, isto é, que o mundo foi criado pelo demo. Muito mais lógico, não ? Dá para entender tudo melhor. Pois os católicos queimaram os cátaros no século XII (favor se informar). Eram gente de primeiríssima, esses cátaros. Eram chamados Os Perfeitos. Paremos por aqui, a coisa tende a se estender. Outra coisa: a igreja não é boba não. Já manjou que mais dia menos dia acontece uma grande cagada, e agora tenta salvar a pele com sutilezas canônicas. Por que não se desfazem de toda aquela tralha de ouro, prata e pedras preciosas que há lá no palácio deles ? Por que não dão as montanhas de terra ou vendem as montanhas de terra e propriedades e dão o dinheiro aos famintos ? Por que os papas, ao invés de discursos lengalenga, não arrancam as vestes, não pulam daquela caideirnha, não ficam nus e nus não discursam um texto veemente, apaixonado e colérico amaldiçoando os canalhas ? Não adianta ficar voando de ceca em Meca e beijando o chão. Não deviam postar-se nus numa praça e ali permanecer até que os homens entendessem que é preciso acabar com todas as clocas do poder ? Mas vamos às nossas orgásticas, gentis e menos imundas putarias. Outra coisa: não sou ingênuo não. Sei muito bem o que vão me responder e desde já respondo: não aceito. “ (Hilda Hirst – “Contos D’Escárnio – Textos Grotescos”)

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