por Aldemario Araújo Castro
10 (dez) considerações:
1. A PEC n. 241/2016 veicula, do ponto de vista da propaganda, uma ideia muito sedutora. Ela
propõe que a despesa (pública) não seja superior à receita (pública) e
pretende, na voz de seus defensores, afastar gastanças, desperdícios e
descontroles. Aproveita-se, inclusive, no plano do convencimento
popular, de graves erros econômicos cometidos recentemente nas
administrações petistas. Tudo isso dialoga muito bem com a gestão dos
recursos domésticos, usados à exaustão como exemplo. Afinal, em casa,
nas finanças pessoais ou domésticas, não devemos gastar mais do que
recebemos, sob pena do enfrentamento de profundas dificuldades.
2. A política econômica de um País não pode ser comparada, em sua
totalidade, com as finanças pessoais ou domésticas. São realidades muito
diferentes em termos de complexidade. Em linhas gerais, a política
econômica formulada e conduzida por um Governo possui três grandes
linhas de ações: a) fiscal; b) monetária e c) cambial. A economia não se
limita a arrecadação de tributos, gastos sociais (educação, saúde,
previdência e assistência social), pagamento de remunerações e
manutenção da máquina administrativa. Temos outros elementos de enorme
importância que movimentam cifras bilionárias ou trilionárias, a exemplo
(meramente ilustrativo) da dívida pública e seu serviço, taxa básica de
juros, nível e administração das reservas internacionais, tamanho da
base monetária, operações compromissadas e outras formas de "ajuste de
liquidez", câmbio, fluxos de capitais e operações de swap cambial.
3. A PEC n. 241/2016 e sua exposição de motivos possuem um foco
estritamente fiscal e desconsideram as vertentes monetária e cambial de
uma política econômica abrangente e consistente. Não se trata de um erro
elementar (esquecer os aspectos destacados). Trata-se de uma opção
consciente no sentido restringir despesas primárias (não financeiras),
notadamente com remunerações, benefícios previdenciários e dispêndios
relacionados com educação e saúde, e manter relativamente livres e fora
das atenções da sociedade os vários instrumentos viabilizadores de
privilégios nos campos monetário e cambial.
A Exposição de
Motivos da PEC n. 241/2016 afirma expressamente: "A raiz do problema
fiscal do Governo Federal está no crescimento acelerado da despesa
pública primária. (...) Torna-se, portanto, necessário estabilizar o
crescimento da despesa primária, como instrumento para conter a expansão
da dívida pública. Esse é o objetivo desta Proposta de Emenda à
Constituição. (...) Com vistas a aprimorar as instituições fiscais
brasileiras, propomos a criação de um limite para o crescimento das
despesas primária total do governo central".
Conforme denuncia a
Auditoria Cidadã da Dívida, em 2015, o estoque de títulos da dívida
interna cresceu R$ 732 bilhões em 11 meses (31/01 a 31/12), em função:
do pagamento de juros, remuneração da sobra de caixa dos bancos
(operações compromissadas que chegaram a ultrapassar R$ 1 trilhão em
2015, quase 20% do PIB) e prejuízos do Banco Central com operações de
swap cambial. O problema não está nas despesas primárias (como vários
estudos econômicos apontam). Nada disso aparece no discurso oficial !!!
4. Segundo o “Novo Regime Fiscal”, que vigorará por vinte anos, será
fixado, para cada exercício, limite para a despesa primária (não
financeira) total do Poder Público Federal, individualizado por seus
ramos com autonomia financeira. Em linhas gerais, o limite referido
equivalerá à despesa primária (não financeira) realizada no exercício
anterior corrigida pela variação do Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo - IPCA, publicado pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística - IBGE, ou de outro índice que vier a
substituí-lo.
Assim, os gastos sociais diretos e indiretos
(despesas primárias), que não são responsáveis pelo desajuste nas contas
públicas, serão praticamente congelados por 20 (vinte) anos. Ficam de
fora do congelamento, como grandes beneficiários dele, as despesas
financeiras (pagamento de juros e amortização da dívida pública). Não
há, portanto, um limite global ou geral de despesas segundo a PEC
241/2016. Dentro desse limite parcial, definido pela proposta, gastos
com pessoal ativo, previdência social e demais gastos sociais estarão
lançados numa disputa fatricida de alocação ano após ano.
5. As
políticas de austeridade ou arrocho fiscal, conhecidas como
"austericídio" na Europa, não se mostram soluções adequadas para
retomada e manutenção do crescimento econômico em cenários de crise. Até
mesmo o FMI já questiona a eficiência dessas políticas. Tudo indica que
o gasto público responsável/inteligente (notadamente como
investimento), sem o recurso a desonerações descabidas e fomento a
políticas creditícias sem sustentabilidade socioconômica, pode obter
sucesso nesse campo.
6. A lógica subjacente à PEC 241/2016
abandona uma reformulação socialmente solidária no "lado" das receitas
públicas. Não se apresenta nada na linha de: a) uma reforma tributária
justa com a devida oneração do capital, da propriedade, dos ganhos
financeiros, supressão de benefícios fiscais inaceitáveis (segundo
notícia da Folha de S. Paulo, “as desonerações de tributos concedida
pelo governo da presidente Dilma desde 2011 somarão cerca de R$ 458
bilhões em 2018"), combate à sonegação tributária (estimada em R$ 500
bilhões anuais) e recuperação progressiva da Dívida Ativa da União e de
suas autarquias (calculada em mais de R$ 1,5 trilhão, por intermédio do
adequado aparelhamento dos órgãos públicos envolvidos, notadamente a
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e a Procuradoria-Geral Federal).
7. Segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, o art. 102, parágrafo
sexto, inciso IV, do ADCT, a ser inserido pela PEC n. 241/2016,
contempla o privilégio de recursos, à vontade, sem teto e sem limite,
para “empresas estatais não dependentes”. Essas são pessoas jurídicas de
direito privado que executam um mecanismo de transferência de recursos
públicos para o setor financeiro privado ao venderem, a investidores
privilegiados, com desconto que pode chegar a 60%, debêntures com
garantia real (oferecida pelos entes federados), pagando juros que podem
superar 20% ao ano.
8. Destaca o DIEESE, "a fixação de um limite
de aumento das despesas primárias do setor público baseado na inflação
passada por 20 anos (com possível revisão a partir do 10º ano de
vigência) congela os atuais patamares reais de gastos correntes e
investimentos por um período bastante longo. Tais gastos não poderão
acompanhar a expansão da demanda por serviços públicos advinda do
crescimento econômico e do simples aumento populacional. Além disso,
como algumas despesas obrigatórias - como a Previdência Social e o
regime de previdência do setor público- estarão sendo pressionadas pelo
aumento do número de beneficiários, pode-se prever que a expansão de
gastos em algumas funções irá implicar em redução de outras, para que o
montante total se acomode dentro do limite. Enquanto isso, não há
medidas concretas que apontem para a redução dos gastos com juros sobre a
dívida pública, que continuam em níveis incomparáveis
internacionalmente e incompatíveis com a situação de endividamento do
Estado.
A aprovação da PEC 241/2016 deverá ter impacto direto no
poder aquisitivo dos salários dos trabalhadores já que, atualmente, no
caso dos servidores públicos, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)
determina que os critérios de aumento dos gastos com pessoal se deem com
base na Receita Corrente Líquida (RCL). Já no caso dos trabalhadores da
iniciativa privada, além do impacto com a possível alteração na
metodologia do reajuste do SM, os trabalhadores para quem ele é
referência podem vir a ter seus ganhos reais comprometidos. Toda a
população brasileira irá ser penalizada com a muito provável redução, em
quantidade e qualidade, dos serviços públicos de saúde e educação.
Outro ponto importante da proposta diz respeito aos limites com gastos
em Educação e Saúde. Com a nova regra apresentada na PEC, fica notória a
possibilidade de redução da destinação de recursos públicos para estas
áreas. Nestes casos é de se esperar que os recursos mínimos garantidos
na Constituição Federal acabem se efetivando como um limite máximo, já
que ficará a critério do Congresso Nacional definir valores superiores
para essas áreas, respeitando o limite total de gastos. Ou seja, poderá
provocar ainda o comprometimento da execução de outras políticas
públicas, cuja finalidade principal é atender às demandas da sociedade.
A proposta de fixação do valor real das despesas ao patamar de 2016
incita uma questão importante não explicitada pelo governo: em caso de
recuperação da arrecadação, com possível retorno de aumentos reais da
receita como se verificou ao longo de vários anos na última década, qual
deverá ser o destino do superávit? Seria utilizado na amortização da
dívida pública ou na redução de impostos?"
Parece fora de
qualquer dúvida razoável que a PEC n. 241/2016 significa um engenhoso
instrumento de ajuste fiscal seletivo. Os gastos sociais do Poder
Público comprometidos com melhores condições de vida para a grande
maioria da população serão meticulosamente congelados ou reduzidos.
Entretanto, no "lado" do mercado financeiro, notadamente aquele
vinculado ao recebimento do serviço da dívida pública, restrições ou
ajustes não serão palavras pertencentes ao vocabulário.
9. A PEC
n. 241/2016 foi concebida e será administrada, se e quando aprovada, por
um banqueiro amplamente festejado pelo mercado financeiro nacional e
internacional. Defendem a medida: a) o mercado financeiro; b) o grande
empresariado; c) a grande imprensa e d) a maior parte, profundamente
conservadora, do Parlamento.
10. São contrários à PEC n.
241/2016: a) os movimentos sociais organizados e b) instituições
diretamente ligadas à luta pela melhor prestação de serviços públicos e
distribuição mais igualitária da riqueza no Brasil (DIAP, DIEESE,
Auditoria Cidadã da Dívida, Plataforma Social, etc).
AUSTERIDADE E RETROCESSO
Plataforma Social
http://plataformapoliticasocial.com.br/austeridade-e-retro…/
NÃO À PEC 241/2016
Auditoria Cidadã da Dívida
http://www.auditoriacidada.org.br/…/10/06/nao-pec-2412016-2/
NOVO REGIME FISCAL (PEC n. 241/2016): MAIS UM INSTRUMENTO DE ARROCHO SELETIVO
Aldemario Araujo Castro
http://www.aldemario.adv.br/novoregimefiscal.pdf
PEC nº 241/2016: o novo regime fiscal e seus possíveis impactos
DIEESE
http://www.dieese.org.br/…/2…/notaTec161novoRegimeFiscal.pdf
REJEITAR A PEC 241/2016 PARA SALVAR O SUS E A SEGURIDADE SOCIAL
Conselho Nacional de Saúde
http://conselho.saude.gov.br/…/06jun27_REJEITAR_A_PEC_241.p…
PEC241/2016. BASTA DE CORTES NOS DIREITOS SOCIAIS E DOS SERVIDORES
ANFIP
http://www.anfip.org.br/…/20160824102911_Panfleto-PEC-24116…
PEC 241/2016: substitutivo aprovado na comissão especial
http://www.camara.gov.br/…/prop_mostrarintegra;jsessionid=B…
A PEC do teto de gastos e a soberania do Brasil
José Álvaro de Lima Cardoso
http://www.diap.org.br/…/26110-a-pec-do-teto-de-gastos-e-a-…
A PEC 241 e o papel do Estado brasileiro
Antônio Augusto de Queiroz
http://www.diap.org.br/…/26284-a-pec-241-e-o-papel-do-estad…
PEC 241 é gatilho para reforma da previdência
Antônio Augusto de Queiroz
http://www.diap.org.br/index.php/noticias/artigos/26365-pec-2421-e-gatilho-para-reforma-da-previdencia
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